Britney Spears e Lana Del Rey: Elas têm mais em comum do que se imagina
Em algum momento, a vida pessoal das duas artistas tem pontos muito parecidos: problemas familiares, amores conturbados e música com escape
Quando terminei o livro de memórias da Britney Spears, precisei de um tempo para processar como essa mulher conseguiu sobreviver a todos os horrores que passou, e em pensar que seus maiores inimigos eram sua própria família. Britney desde o início de sua carreira foi julgada pela imprensa mundial. Colocou silicone nos seios? Como é sua voz natural? Por que está inchada? Essa última pergunta em específico coloca Britney numa versão pop de Capitu... Traiu ou não traiu Justin Timberlake?
No livro ela deixa bem claro o que aconteceu entre ela e o, entre muitas aspas, “príncipe do pop”. Conta também seu histórico familiar de violência e abandono. É um relato cru e intenso. Confesso que tive taquicardia nos capítulos finais, nos quais ela relata o período que foi internada a força numa clínica de reabilitação, sem necessidade, enquanto sua família desfrutava uma vida de luxo na Flórida.
Devemos, mais uma vez, parar de cair nessa narrativa de que o homem é o inocente, de “ele é só um garoto”, e de tratar mulheres como más, manipuladoras e vilãs.
Britney está viva, livre e pronta para viver a vida que foi roubada dela.
Eu nasci em 2001, então as canções e performances de Britney estiveram sempre presentes no meu crescimento. O estilo femme fatale no clipe de Toxic, — no qual meu pai assistia e a chamava de “gostosa”, e eu achava na verdade muito bonito — o álbum Blackout, o clipe maravilhoso de Circus, o desastre da era Britney Jean, a sua glória em Glory, o último disco até então.
Crescendo, fui atrás dos discos mais antigos. Não posso deixar de mencionar o Femme Fatale, de 2011. A produção eletrônica, com o uso certeiro de auto tune e batidas up-tempo é um dos fatores dos quais eu amo música eletrônica hoje. ‘Till The World Ends, com aquele clipe apocalíptico, Inside Out, I Wanna Go e até mesmo a esquecida pop-rock Don’t Keep me Waiting mexeram demais na minha cabeça de dez anos.
Não pude perceber, durante a leitura o quanto a vida da pessoa Britney Spears se assemelha a de Lana Del Rey. Não se assuste, irei discorrer sobre.
Apesar de Britney ter surgido como estrela mirim, começando na Disney e depois sendo cantora teen, a própria sempre – e ainda tem – muitos problemas familiares. Junto a isso tem o assédio constante da imprensa. Perseguições por paparazzi já resultaram em mortes. E sim, estou falando da Lady Di.
Já Lana Del Rey, apesar de terem espalhado desde o início da carreira que ela vinha de uma família rica, comenta hoje em sua conta privada no Instagram que não era bem assim.
Com 13 anos, não existia Lana Del Rey, e sim, Lizzy Grant, apelido derivado do nome verdadeiro da Lana. Nessa tenra idade, ela foi mandada para um internato para tratar de problemas com alcoolismo. Isso pode ser confirmado na canção nunca lançada, “Boarding School”. Numa idade muito nova, Lizzy já passava por muita coisa.
Então em 2011, a vida de Lizzy deu uma reviravolta e aí nascia Lana Del Rey. O sleeper hit — hoje considerado canção da década — Videogames brilhava na internet. Ter conhecido sua obra em 2013 foi fundamental para quem eu sou hoje. Nessa época troquei o pop barulhento e dançante de Britney para a melancolia quente de Lana.
Os fãs de Lana já sabiam que algo ia diferente em sua família. Há poucas fotos com a mãe e várias com os irmãos e o pai. Só em 2021 pudemos entender o porquê.
O ano em questão foi desafiador para Lana. Os cancelamentos online, a pandemia e o lançamento de dois discos sem divulgação pareciam influenciar um desmoronamento na carreira dela. No final de 2021, Blue Banisters foi lançado. Na semana de lançamento, Lana disse que as respostas estariam nas letras e que não divulgaria o projeto. Foi um disco feito para os fãs.
Um dos três singles foi a canção Wildflower Wildfire, uma canção bem soturna. Deixo aqui um trecho:
“Meu pai nunca interveio quando a esposa dele ficava com raiva de mim
Então acabei estranha, mas doce
E tempos depois, hospitais me mantinham de pé
Confortavelmente entorpecida, mas com o lítio veio a poesia”
Sabe quem teve que tomar lítio? Britney Spears para tratar depressão e um suposto diagnóstico bipolar. Mais uma infeliz coincidência.
Já em 2023, em Fingertips, do disco mais recente Did You Know..., ela escancara toda a relação com a família. O trecho mais importante é o que ela justamente fala da sua “mãe”. Na hora de cantar esta doce palavra, o instrumental sobe. Ela foi tão machucada e esquecida por tanto tempo por essa mulher que a gerou que nem ela merece ser chamada de mãe:
“Caroline
Que tipo de mãe ela era para dizer que eu acabaria em instituições?
Tudo o que eu queria fazer era beijar Aaron Greene e sentar à beira do lago
Espremendo limão nas bebidas que eles faziam
Ter um bebê aos dezesseis, a cidade em que nasci e que morri”
(Deixo como link o vídeo só sobre a música feita pela Fernanda Soares, da Hollywood Forever TV no Youtube. )
Além da internação de Lana, na hora de sair, na expectativa de ir de volta para casa, descobriu que ia morar com o tio na Espanha. Ela completou o aniversário de 16 anos dentro de um avião para morar do outro lado do oceano. O curioso é que ela disse isso no primeiro disco, em 2012, na canção This is What Makes Us Girls, no trecho “Sweet Sixteen, when I had arrived...”. Ou seja, Lana sempre deu sinais, mas se mantinha distante da pessoa Lizzy e escrevia com a persona Lana Del Rey.
Depois de muitos anos, Britney pôde contar sua verdade, seu lado, sua história. Ela foi forçada a abdicar sua saúde mental a troco de sustentar a “família”, de conseguir mais tempo com os filhos. Ela diz que não pensa em voltar para a música tão cedo e, honestamente, concordo com ela. Depois de tanta guerra, Britney merece paz.